quarta-feira, 2 de abril de 2014

Se deixe ir ao fogo.

Nunca tive muitos amigos ou sai muito de casa. Não era de brincar em parques ou encher a casa de pessoas ou passar o dia na rua, de modo que as recordações que tenho da minha infância são os livro que li.
Minha mãe é professora, apaixonada por literatura (e pasmem, gramática) e todos as semanas pegava livros emprestados na biblioteca da escola em que trabalhava, enchendo meu dia de historias.
Porque eu to falando sobre isso? Porque esses dias eu estive aqui remoendo meus medos e minhas inseguranças e sempre encontrando novas maneiras de cometer os meus mesmos erros de sempre. E então eu me lembrei de uma vez em que ela chegou em casa toda contente, depois de um dia cansativo com" seus meninos", como ela chamava seus alunos, e me veio toda sorridente com um livro, segundo ela, de seu autor favorito. 
Foi a primeira vez que eu li Rubens Alves. Era um livro azul, relativamente pequeno com apenas uma meia lua amarela na capa e o titulo "O amor que acende a lua".  É um livro de contos, e entre tantos contos, essa manhã eu acordei lembrando da historia da pipoca. 
Rubens Alves nos compara a uma pipoca. Nós, quando submetidos ao fogo, sentimos medo, e quando pensamos no que seria o fim, estouramos e nos tornamos aquela coisa macia e fofinha que chamam pipoca. 
(Quem me conhece, sabe o quanto metáforas me fascinam. Sempre consigo fazer as comparações mais malucas que se poderia pensar. E foi com essa que Rubens Alves me conquistou.)
Se engana quem pensa que a historia da pipoca para por ai! Ainda tem o tal do "Piruá". O milho medroso que se recusa a se abrir ao novo, e quando termina a alegria do estouro termina sozinho na panela e acaba no indo do lixo. 
Esta manhã eu acordei me sentindo mais piruá que pipoca. E fiquei com medo, do fogo estar começando a diminuir e eu nunca mais poder me tornar pipoca. 
E eu resolvi parar de sofrer e parar de rever tudo. Deixa passar. O que passou ja era, sofrer vai mudar? Pelo tanto que eu já me fiz sofrer, eu acho que nem preciso de resposta. 
E eu decidi deixar de lado. Só as tristezas e as coisas ruins que tomam meu tempo. Porque agora eu estou no fogo, e eu não quero perder as faíscas, a felicidade ou o burburinho do estouro.
Quero que me deem licença, porque a minha vida tá acontecendo agora. E eu preciso estourar. 



"Ignoram o dito de Jesus: "Quem preservar a sua vida perdê-la-á".A sua presunção e o seu medo são a dura casca do milho que não estoura. O destino delas é triste. Vão ficar duras a vida inteira. Não vão se transformar na flor branca macia. Não vão dar alegria para ninguém. Terminado o estouro alegre da pipoca, no fundo a panela ficam os piruás que não servem para nada. Seu destino é o lixo.

Quanto às pipocas que estouraram, são adultos que voltaram a ser crianças e que sabem que a vida é uma grande brincadeira..." (Rubens Alves, A pipoca.)

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