quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

No analista.

Chegou atrasado como sempre chegava, pois essa era sua estranha forma de pontualidade. Deitou-se no sofá onde deveria apenas sentar, pois já que estava ali, queria fazer como nos filmes. Do outro lado, de uma distancia impessoal, o analista o observava. Cara estranho, pensou.
- Então, doutor. Eu tô sentindo sozinho, sabe? Daquelas solidões doidas, estranhas, que não passam. Outro dia eu estava no ônibus, veja o senhor, cheio. E eu fiquei pensando nas coisas. Fiquei pensando naquele cara que disse uma vez sobre estar sozinho em multidões. O senhor conhece essa né? Claro que conhece, maior clichezão. Pois é, tava pensando nisso. Como é que eu explico pro senhor? Deixa eu ver. Imagina que a sua mãe te leva num show. Ok, comparação meio estranha, mãe levando criança em show. Mas é isso mesmo. E no meio da multidão a mão solta da dela, e você fica lá, pequeno, perdido no meio de um monte de gente grande, que não te vê. E você olha pra todos os lados e não vê nenhum rosto conhecido. Não tem saída. Você não tem dinheiro e mesmo que tivesse não saberia voltar pra casa, afinal, você é uma criança. Imagina a solidão dessa criança. Imagina o desespero. Pois é, doutor. Eu acordei me sentindo assim. Deu pra entender? Acho que minha hora acabou, né? Então vou indo. A gente se vê por ai, no meio da multidão. Brigado ai pela ajuda. Até.

Pela janela, o analista observou o moço sair do prédio e pegar um ônibus, ironicamente, lotado. Estamos todos sozinhos, pensou. E foi abrir a porta.

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